Nos dias 13 e 14 de Novembro de 2001 decorreu na cidade belga de Charleroi um colóquio sobre "Crédito ao Consumo e Harmonização Comunitária". Estiveram presentes cerca de 300 representantes dos profissionais de crédito, das organizações sociais e dos consumidores, pertencentes a 26 países europeus.

Com este colóquio, pretendeu-se examinar as particularidades dos sistemas nacionais registadas em matéria de concessão de crédito aos particulares e de prevenção do incumprimento e do sobreendividamento das famílias. Simultaneamente, procurou-se expor as mais recentes orientações comunitárias destinadas à eliminação das divergências regulatórias de cada país, susceptíveis de dificultar o bom funcionamento do mercado interno de crédito aos particulares.
Neste colóquio participou a coordenadora do Observatório do Endividamento dos Consumidores (OEC), Prof. Doutora Maria Manuel Leitão Marques, que, na sessão intitulada "La défaillance de paiement: causes et remèdes", apresentou a comunicação "Les causes de la défaillance et les mesures à prendre" (cf. anexo).

Neste colóquio sobressaíram dois grandes temas de discussão. O primeiro, dizia respeito à problemática do crédito ao consumo; o segundo, à questão do sobreendividamento das famílias, nomeadamente em termos da sua prevenção e do seu tratamento.

Estes temas suscitaram acesos debates, polémicas e convergências de opinião que, em síntese, se relatam a seguir.

O crescente fenómeno do endividamento das famílias e o aumento dos casos de sobreendividamento, sobretudo passivo, tem sido alvo de imensas preocupações no espaço europeu e não só. Calcula-se que 5 a 10% da população europeia está directamente ligada à problemática do sobreendividamento.
No domínio do crédito ao consumo concedido a particulares, uma das questões mais enfatizadas e discutidas foi a da nova proposta de directiva comunitária sobre crédito ao consumo. Profissionais do crédito, representantes dos consumidores e diversas organizações sociais mostraram-se favoráveis a esta iniciativa, esperando que ela traga a harmonização necessária que garanta a liberdade de concorrência, uma maior protecção dos consumidores e uma prevenção mais eficaz do sobreendividamento.

Para a prossecução destes objectivos, a directiva deverá incluir o direito de renúncia, de acordo com o qual o consumidor pode renunciar a um contrato dentro do prazo de reflexão, assim como uma regulação equitativa das consequências financeiras que resultem do incumprimento. Por outro lado, alguns aspectos devem ser cuidadosamente ponderados, designadamente o que diz respeito à publicidade, à mediação, ao acompanhamento das medidas de crédito, às diferenças entre o norte e o sul da Europa relativas à concessão de crédito, à harmonização "máxima" das regras da concorrência e à criação de ficheiros positivos que permitam o acesso a uma informação mais credível.

Quanto ao cálculo da taxa anual efectiva global (TAEG), as opiniões repartiram-se entre a harmonização do cálculo da taxa em todos os países europeus e o reconhecimento dos problemas que advêm desta harmonização em matéria de concorrência. A nova regulamentação do crédito ao consumo deverá ter em conta a influência do contexto cultural na aquisição do crédito, nomeadamente na análise do seu destino e na diferença entre a sua concessão para aquisição de bens de primeira necessidade ou de outro tipo.
No segundo grande tema em discussão, o do sobreendividamento das famílias, foi sugerida a criação de um Observatório Europeu do Endividamento que teria como função a análise sistemática do endividamento e dos casos de sobreendividamento. Este Observatório deveria permitir, por um lado, a análise de dados estatísticos e a realização de estudos sistemáticos sobre o endividamento e o sobreendividamento, e por outro lado, deveria avaliar os resultados das diferentes experiências e legislações nacionais, melhorar as condições de funcionamento do mercado interno e a protecção dos consumidores mais desfavorecidos. Referiu-se, ainda, a necessidade de adoptar em cada Estado-membro legislação relativa à regulamentação colectiva de dívidas, que respeitasse o interesso legítimo dos credores e a dignidade humana dos devedores.

Para combater o sobreendividamento foram enunciadas algumas medidas de prevenção relativas à formação, aconselhamento e acompanhamento dos consumidores, à responsabilização das instituições de crédito, à qualidade e transparência da informação, ao cálculo da TAEG e ao controlo da publicidade.

Neste âmbito, a discussão em torno dos ficheiros de crédito assumiu especial destaque. Estes ficheiros, positivos ou negativos, podem ajudar a evitar o sobreendividamento dos indivíduos, desde que seja salvaguardada a sua esfera da vida privada. O reconhecimento destes ficheiros e a sua interconexão no espaço europeu permitiria uma maior abertura do mercado e, por sua vez, preservaria a protecção máxima do consumidor. Esta protecção máxima é definida por um conjunto de regras relativas à transparência de mercado, aos termos contratuais e à preservação da concorrência do mercado.

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